15 março 2006

Nasceu uma estrela?! (Ilustração concluída por Nuno Alves/Who)

Já andava eu lá para os lados do castelo de São Jorge, a dar cambalhotas na escola de circo, e percorrendo Portugal de lés a lés com o “Cesta d ’artes”, quando recebi um convite da minha colega Sofia Cid. Formaríamos um grupo de coros femininos juntamente com a Iolanda Baptista, nossa colega, que na realidade tinha por apelido "Grelado", mas como odiava esse nome, tal era a sua semelhança com grêlo, adoptou o santo nome Baptista . Ainda faria parte do grupo, uma mulata amiga da Sofia. Realmente não me lembro do nome dela, mas também conforme entrou - saíu! A mulata não tinha andamento para “rock star” e depressa caiu no esquecimento das Cotonetes. Perdão, esqueci-me de referir que o nosso agrupamento vocal se chamava “As Cotonetes”, numa paródia às míudas que acompanhavam o Kid Creoule- as “Coconuts”. A diferença é que nós não éramos côcas malucas mas sim, objectos de higiene pessoal, que se propunham limpar o ouvido musical dos portugueses! Ah! E tínhamos a concorrência das “Valquírias” as moças dos Ena pá 2000, de que por ironia do destino eu viria a fazer parte 15 anos mais tarde.
Começámos a ensaiar, íamos fazer a tournée com os “Afonsinhos do Condado”, emprestando as nossas vozes ao albúm Açucar. As coreografias eram de primeira qualidade - direita, esquerda, frente, trás. Aquilo é que nós suávamos nos ensaios. Até estou cansada, só de me lembrar!
O look também é digno de referência. Como os Afonsinhos tinham um visual todo descontraído com um non sense q.b, nós resolvemos adereçarmo-nos com objectos da nossa preferência. Assim, a Sofia num fato de blusa e calção ás riscas pretas e brancas cheio de penduricalhos musicais- apitos, gaitas, cornetas, etc – assumia a sua veia poética terminando o figurino, com uma bóina emplumada e uns sapatos á Luis de Camões. A Iolanda, na altura dona de um look punk, tornou- se na “punkiosa” do grupo envergando o calção com a blusa de rede carregada de chaves, meia de rede e claro, a bela bota da tropa. O que era engraçado, é que a Iolanda era a mais certinhado grupo, sempre a refilar com os nossos comportamentos. Vai-se lá compreender como é que estas coisas acontecem?!! Bem, falto eu...eu, nessa época gostava da Marilyn Monroe, ainda gosto, há coisas que nunca mudam, e por isso assumi um ar mais «baby doll», com o meu vestidinho preto de tutus às bolinhas e de tules vermelhos, adornado por dezenas de palhaços de plástico, afinal de contas eu era e sou palhaço!
E foi nestes preparos e com as vozes afinadas, que iniciámos um ano de estrada com os Afonsinhos. Mais tarde, haveríamos de acompanhar os “Peste e sida” mas isso são outras histórias! Foram muitos concertos e bons. Mas, não há bela sem senão e um dia no Estoril, aconteceu algo que eu pensava só existir nos filmes escalão B de Hollywood.
Num dia de Verão com ventos ciclónicos, dávamos um concerto para os veraneantes da praia do Tamariz. O problema foi o som. O som no palco era perfeito, no entanto o som do público era levado pelo vento, de maneira que se ouvia tudo cortado, aos soluços. O público passou-se. Foi a histeria geral. Entre assobios e asneiradas, famílias numerosas abriram as lancheiras e começaram a voar na nossa direcção, laranjas, pêssegos e tudo o que houvesse á mão! Eu não estava a acreditar naquilo e como boa refilona que sou, preparava-me- agarrando numa laranja- para começar uma batalha campal. Em bom tempo fui impedida, pela nossa “punkiosa” com um ar reprovador.
Hoje agradeço-lhe, pois de outra forma a minha carreira musical teria morrido na praia do Tamariz, não podendo mais tarde ser protagonista de outras tantas aventuras de “rock star”. Essas, conto-vos noutra altura...

À memória das Cotonetes- um beijo

Suzie Peterson
36 anos
Aderecista, figurinista, mulher-palhaço, cantora
Lisboa

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